Da pauta à publicação do caderno especial O Filho da Rua, a repórter do jornal Zero Hora, Letícia Duarte, percorreu diversos obstáculos, angústias e conflitos. Durante três anos, acompanhou a trajetória de Felipe, garoto de rua em Porto Alegre. O resultado, um caderno especial de 16 páginas, recebeu o Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, na categoria especial Criança em situação de rua. Em entrevista à Abraji, a repórter conta sobre o processo de apuração do especial.
A ideia inicial da pauta era mostrar como nasce uma criança de rua. A primeira fonte de Letícia foram os próprios meninos de rua. Porém, ela logo percebeu que eles contavam muitas histórias inventadas e mentiam sobre o nome, idade e família. Para obter informações mais precisas, entrou em contato com as redes de assistência para crianças de rua.

Antes de se encontrar com Felipe, Letícia já o conhecia pelos documentos e pelas conversas com a mãe. Segundo ela, o menino viu na repórter um contato com sua mãe. Gravou inclusive um recado para a mãe no gravador. “Ele gostou de ser personagem, porque alguém prestou atenção nele”, disse ela.
Com autorização do Juizado da Infância e da Juventude, a jornalista acompanha Felipe desde março de 2009. Ao longo da apuração, Letícia percebeu que muitas crianças moradoras de rua tinham família. A partir de então, ela acrescentou uma nova pergunta à pauta: por que as crianças continuam na rua, apesar de todos os programas de assistência e recuperação?
A pauta, inicialmente programada para dois meses, levou três anos para ser publicada. O menino mudava continuamente de lugar e a mãe não tinha telefone. Durante a apuração, a familía mudou três vezes de endereço. Também havia falhas nas redes de atendimento. Restava apelar para vizinhos e conhecidos. “Cada nova apuração era uma nova busca”, diz ela. “Eu tinha muito medo de perder o contato, porque era uma conexão muito tênue com a mãe e com o menino”. Às vezes, a repórter saía pelas ruas sem saber se ia encontrá-lo.
Outro desafio que Letícia enfrentou foram as mentiras contadas pelo menino. Em diversos momentos, Felipe recontou seu passado de formas diferentes. Para chegar a uma história mais precisa, a repórter se cercou de diversas outras fontes, como documentos, informações de conselhos tutelares e escolas, relatos de familiares, educadores ou vizinhos.
Ao mesmo tempo em que a jornalista estava bem perto da história e da família, ela tentava se distanciar para não comprometer emocionalmente a reportagem. Ao longo da apuração, ela se tranquilizou ao perceber que a maior ajuda que poderia oferecer era contar a história de Felipe.
Hoje, Felipe tem 14 anos. Ainda cede à fissura pelo crack, tem medo de morte e da prisão. Porém, foi incluído em outro programa de recuperação. Sempre que se encontra com a repórter, mostra suas mãos limpas – o menino ficou com vergonha de suas unhas e dedos sujos na capa do caderno especial. “O que a gente sonha é que o jornalismo possa ter esse papel transformador”, completa Letícia. (ABRAJI).
A reportagem completa abaixo:
Nesta página encontra-se as mensagens enviadas pelos leitores do Zero Hora, em resposta a reportagem produzida:
http://wp.clicrbs.com.br/editor/2012/06/17/leitores-repercutem/
Reflexão:
Muitas vezes vemos uma reportagem e nem temos a dimensão do trabalho que realmente os envolvidos tiveram para chegar no processo final. Muitas vezes os riscos que correram, os dias que não dormiram, os medos que enfrentaram, por isso me chamou bastante atenção quando li esse texto do site da ABRAJI. Pode parecer uma questão bastante batida, mas achei válida a introdução deste texto em meu blog para a valorização de profissionais que muitas vezes não recebem o devido valor.
Achei interessante também ressaltar a opinião dos leitores em relação à matéria, podemos notar que muitos tem a noção e a dimensão do trabalho de todos os envolvidos em uma reportagem.
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